HISTORINHAS COM DENDÊ (cont.)
26. NA EMERGÊNCIA
No aglomerado de gente à porta do hospital público, toca o celular da senhora ao lado. Ela atende e começa a explicar o ocorrido:
– Foi uma livração, fulana! Ele pegou a faca e foi para cima dela, para dar uma facada na coitada. Aí a cachorra avançou nele e não deixou. Protegeu a dona! Foi o Senhor Jesus e a cachorra que salvou (sic) ele!
É a primeira vez que ouço falar do auxílio de um cachorro a Jesus.
27. NA ALTA
À saída do hospital público, com alta médica, a paciente comenta com a oftalmologista que fez sua avaliação final e que a via pela primeira vez, após a cirurgia:
– Eu tive um desmaio, já na hora de me dirigir para o ônibus da excursão para ir embora, ao fim do passeio. Caí com o rosto no chão e tive esse problema todo no olho.
A médica ouvia tudo com atenção, exclamando a instantes, com o acento baiano:
– Ah, foi?!
E a paciente continuou a narrar os detalhes da situação por que tinha passado. Até que no final, ouviu da médica:
– Graças a Deus!
A paciente, sem entender, perguntou o porquê do “graças a Deus”. E a médica com a lógica afiada:
– Porque foi no fim do passeio. Você já tinha visto tudo, passeado à vontade, conhecido todos os pontos turísticos de Salvador. Já pensou se fosse na chegada? Você vai ter história para contar daqui.
28. COM OU SEM EMOÇÃO?
A paciente aguarda na maca, na emergência do hospital público de Salvador, o momento de ser conduzida à sala de cirurgia.
Daí a instante, atendendo o grito “Apoio!” da enfermeira acompanhante, chega o maqueiro simpático, que a cumprimenta, diz seu nome, fala que a conduzirá e pergunta:
– Quer com emoção ou sem emoção?
Na Bahia, até mesmo a simples condução de uma prosaica maca hospitalar, pode ser com este diferencial.
A paciente responde, então, que quer da melhor forma possível.
O maqueiro empunha a maca e sai pelos corredores, em velocidade de cruzeiro, curvando aqui e ali; desviando-se de um e outro obstáculo; produzindo sonoplastia de ambulância – Uó! Uó! Uó! – para abrir passagem; acenando a cada um que o cumprimenta – Aí, Valtinho! -; e brecando o veículo alucinado, com a descarga da pressão dos freios, à porta da sala: Shiiiiii! Shiiiiii! Shiiiiii!
Valtinho é um maqueiro beatbox.
Daquela viagem, a paciente estava salva. Espantada, mas salva.

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